Perfil do craque


Conheça a história do camisa 10


ANDRÉS NICOLAS D'ALESSANDRO

Se questionarem Andrés Nicolás D'Alessandro sobre sua paixão pelo futebol e de onde surgiu o interesse em ser um jogador profissional, ele responderá: "Acho que nasci com o futebol na cabeça". Foi assim, com a certeza de sua escolha e a obsessão por vencer, que "El Cabezón" sempre levou sua vida no mundo da bola. Dos primeiros passos no baby fútboll - espécie de futebol de salão praticado na Argentina - até os toques de classe com a camisa 15 da Seleção Argentina, D'Alessandro enfrentou dificuldades, passou por maus momentos, mas nada, em absoluto, que o deixasse se abater ou desistir de seu brilhante e estrelado destino no futebol.

Se a trajetória de D'Ale não é propriamente um tango, cheio de dramas e lágrimas, como é comum entre os jogadores de futebol, também não pode ser resumida nas mariposas de Fito Paez. Seus pais, Gladys e Eduardo, desde cedo batalharam para realizar o sonho do filho. "Eles sempre contam que eu só queria saber da bola. Jogava na rua, em casa, em qualquer lugar... Eles trabalhavam, mas faziam um esforço muito grande para me proporcionar a oportunidade de jogar futebol", recorda ele.

“Acho que foi a época mais feliz da minha vida. Não tem pressão, não tem problema. Não tem algumas coisas da rotina de um jogador profissional que incomodam. Quando você é garoto, só se diverte, joga com os amigos todos os dias. Eu me divertia, mas não gostava nunca de perder, acho que o jogador de futebol nasce com isso. Uma coisa que aprendi com meu pai foi isso: lutar pelo que gostamos! Eu nunca fui obrigado a nada, eu fazia porque gostava. Você nunca sabe se chegará ao profissional, mas o meu pensamento sempre foi jogar futebol. Eu via na televisão os jogos na Europa e achava que aquilo não existia, porque estava muito longe. O sonho era ser chamado para o profissional, mas você nunca sabe quando vai acontecer”.

E foi aos 9 anos que D’Ale iniciou sua trajetória no futebol, nas escolinhas do River Plate. “Já tinha mais responsabilidade, com horário para treino. Meu pai saía no meio do trabalho para me levar ao clube. Viajávamos muito para jogar campeonatos, tínhamos um time muito bom! Tinha o Javier Saviola, que já com aquela idade fazia a diferença. Aos poucos fui crescendo, comecei a jogar com os maiores e os técnicos já começavam a observar. Eu não jogava muito na base, porque era muito magrinho, pequeno... Falavam sempre que eu era uma grande promessa, mas diziam também que era muito baixinho, fraco, que tinha que fazer um trabalho físico para crescer. Mas eu não me importava com isso, só queria saber de jogar, não entendia nada. Eu nunca deixava de jogar, quando não era convocado com o River, eu jogava com meus amigos na rua. Até que, quando eu estava na “quinta divisão” na base do River, chegou o técnico Jorge Gordillo. Ele já me conhecia, pois trabalhava na base do Independiente e já havíamos nos enfrentado. Ele lembrou de mim, que eu tinha decidido um jogo contra o Independiente, e logo nos primeiros treinos ele perguntou: ‘Cadê o canhoto, cadê o canhoto?’, e foi então que comecei a ser mais utilizado. Fui então para a “terceira divisão”. Então comecei a ter mais responsabilidade e projeção. Não fiquei nem um ano e já me chamaram para o profissional”.

O tempo foi passando e o menino que não gostava de perder foi cada vez se destacando mais. Em 28 de maio de 2000, aos 19 anos, o sonho começava a virar realidade. D’Ale entrava em campo pela primeira vez no time profissional do River, no segundo tempo da partida contra o Unión Santa Fé. No ano seguinte, mais um sonho se concretizava, jogar pela Argentina. D’Ale foi um dos destaques na conquista do Mundial sub-20 atuando ao lado de atletas como Leandro Romagnoli, Javier Saviola e Maxi Rodriguez. Daí em diante, passou a ser um dos grandes nomes do River, sendo campeão argentino em 2002 e 2003.

“Sempre tive o suporte da família. Tudo que consegui no futebol foi por meus pais. Meu pai trabalhava de 15 a 20 horas por dia como taxista, tudo que fiz foi por eles. Depois formei minha família e também me dedico por meus filhos e por minha esposa. Meus pais me deram as coisas até quando não tinham condições, nunca me deixaram faltar nada. E agora fico feliz de poder dar boas condições a eles, que é mais do que merecido. Eu estou muito orgulhoso de ser quem sou e isso se deve a meus pais. E eu sempre penso também na minha avó, Beatriz, que ajudou a me criar, ela ficava comigo enquanto meus pais trabalhavam”.

Aos 22 anos, em 2003, vários clubes europeus estavam dispostos a contratar o meia. No meio do ano, o Wolfsburg, da Alemanha, foi quem fez a melhor proposta ao River. Foram três temporadas na Alemanha e mais de 70 jogos pelo clube. D’Ale ainda disputou uma temporada pelo Portsmouth (Inglaterra) e duas pelo Zaragoza (Espanha), passagens por grandes centros do futebol e que o ajudaram muito a crescer na carreira.

“Poderia falar muito de todos os lugares que passei. Gostei muito da Alemanha, fiquei dois anos e meio lá no Wolfsburg. É um futebol bem difícil de jogar, pois tem muito contato físico. Fizemos a melhor campanha da história do time até aquele momento. Na Inglaterra, também foi muito bom, cheguei ao time em Janeiro, junto com outros jogadores, e o Portsmouth estava para cair, estava 11 pontos abaixo da linha de rebaixamento e conseguimos nos salvar no último jogo. No penúltimo, oito mil pessoas foram ao jogo fora de casa. Foi inesquecível! E a passagem pela Inglaterra também foi marcante porque minha filha, Martina, nasceu lá. Fiquei pouco tempo, mas aconteceram muitas coisas importantes. Na Espanha acho que estive no time com mais condições nos quais pude atuar na Europa. O Zaragoza tinha Diego Milito, Gabriel Milito, Ayala, Aimar, Sérgio Garcia, Carlos Diogo, Ponzio... Eu cheguei lá por empréstimo, tinha oferta também de Portugal, mas eu queria jogar na Espanha. E o time era muito bem formado, classificamos para a Copa da UEFA, depois de uma boa campanha, e fiquei feliz de ter atuado em 36 dos 38 jogos possíveis. Depois disso, o clube me comprou em definitivo”.

Durante sua jornada na Europa, D’Ale também foi figura frequente na seleção argentina. Em 2004, participou da conquista da medalha de ouro olímpica. Ainda esteve na Copa América do mesmo ano.

Após cinco anos de Europa, D´Ale retornaria à Argentina em 2008 para jogar no San Lorenzo. Com Ramon Diaz, seu primeiro treinador, no comando, disputou a Copa Libertadores. “A ideia era voltar, porque queria que meu segundo filho nascesse lá. Na Inglaterra, tínhamos passado por algumas dificuldades, quando minha filha nasceu, porque estávamos sozinhos, longe do nosso país. E veio então a possibilidade do San Lorenzo, todos achavam que eu ia voltar pro River, mas acabei indo pro San Lorenzo. A ideia não era voltar e me acomodar na Argentina, mas apenas passar por esse momento importante no meu país. Acabei ficando seis meses, emprestado pelo Zaragoza, e foi muito bom! Brigamos pelo título local e também pela Libertadores, foi a melhor campanha do San Lorenzo na história da Libertadores. Não foi fácil ter que enfrentar o River lá dentro do Monumental. Acabamos eliminados da Copa Libertadores para o time que depois seria campeão (a LDU, do Equador) e nos pênaltis.

Com o fim do empréstimo, veio um novo desafio. D’Ale iria jogar no Brasil, pelo Internacional. E foi no país vizinho onde conquistou mais títulos em sua carreira e onde virou ídolo da nação Colorada. No Inter, o meia virou camisa 10, Homem Gre-Nal, capitão e referência.

“É como se fosse um conto, pois nunca imaginei que fosse estar aqui e ainda mais com o carinho que todos têm por mim. O mais importante é que as pessoas reconhecem o jogador como ser humano. Fazemos as coisas dentro do campo, mas também temos a vida fora dele. Meu dou bem com todos os torcedores. Nunca imaginei ganhar Libertadores, Sul-Americana... brigar por quatro ou cinco títulos no mesmo ano, como foi em 2009, quase fomos campeões do Brasileirão. Eu sabia que estava chegando em um grande clube, mas não imaginava que, em tão pouco tempo, íamos conseguir tudo o que conseguimos. Para mim foi o clube mais importante que eu estive, junto com o River. Esses títulos vão ficar na minha memória para sempre, mas nada se compara à Libertadores, porque é uma competição muito complicada. Já havíamos vencido a Sulamericana, mas nada se compara à Libertadores. Eu acho que tive sorte de chegar a um time que já estava formado, e com jogadores de muita qualidade. Tinha o Alex, Guiñazú, Nilmar, Magrão, Edinho... Todos jogadores de qualidade e que já se conheciam. Então entrei no time que já estava pronto pelo Tite, e consegui ajudar. Cheguei, joguei o Brasileiro, já aconteceu logo no Gre-Nal, ganhar daquela forma o clássico, depois conquistar a Sul-Americana, o Gauchão. Claro, que nem sempre estive no melhor do meu nível aqui em Porto Alegre, têm vezes que o rendimento cai um pouco, mas estou feliz, porque mesmo nos maus momentos brigamos por todas as competições que entramos”.

Com a camisa do Inter, D’Alessandro ganhou sete de oito Campeonatos Gaúchos disputados. Fez parte do grupo campeão da Copa Sul-Americana (2008), da Libertadores (2010) e da Recopa (2011). Se despediu do clube com mais um título: a Recopa Gaúcha, em 2016.

“Foram 340 partidas em que vesti com o maior orgulho do mundo a camisa colorada. Estreei em um Gre-Nal, fui muito feliz nos clássicos que disputei, conquistei todas as taças possíveis na América, dominamos o Campeonato Gaúcho, fui até artilheiro. Os momentos vividos na Libertadores de 2010 serão para sempre inesquecíveis. Pelo Inter, fui escolhido o melhor jogador das Américas e voltei a jogar pela seleção. Minha história no Inter rompeu a barreira das quatro linhas. Fiquei esse tempo todo aqui não apenas pela identificação que criei com o clube. Foi muito mais que isso! Em Porto Alegre, finquei raízes. Minha família foi muito bem tratada aqui. Nós, argentinos, com toda a rivalidade que se diz entre os dois países, vivemos anos maravilhosos aqui! Posso dizer que sou gaúcho de coração! Sou porto-alegrense (até título de cidadão da cidade ganhei). Meu filho, Gonzalo, nasceu aqui! É brasileiro, gaúcho e, claro, Colorado”.

Em fevereiro de 2016, D’Ale mais uma vez vestiria a camisa do River. Após 13 anos, foi contratado por empréstimo para jogar o Campeonato Argentino e a Copa Libertadores. E, claro, ser campeão. Em 25 de agosto, com D’Alessandro em campo, o River conquistou o título da Recopa Sul-Americana.

“São essas coisas que a gente não espera e nem imagina. Sentimento de alívio e imensa alegria que vivi. Um título que desejava muito, um momento especial junto à minha mulher, filhos, pais, irmão e amigos que sempre estiveram comigo e sabem o quanto queria que tudo saísse assim. Graças a todos que sempre estiveram ao meu lado, ao grupo que fez tanto esforço para alcançar esse título, ao River por deixar eu viver isto neste momento da carreira e desfrutar das coisas boas, que passam rápido”.